A Polícia Federal (PF) indiciou 31 pessoas de Mato Grosso e outros estados por participação em um esquema bilionário de grilagem e fraude com créditos de carbono no sul do Amazonas. As investigações apontam a existência de uma organização criminosa estruturada, responsável por movimentar R$ 180 milhões com a venda irregular desses créditos.
A investigação faz parte da Operação Greenwashing, deflagrada em 5 de junho de 2024 pela PF em Rondônia. Segundo os relatórios finais encaminhados à Justiça Federal, trata-se da maior fraude com créditos de carbono já apurada no Brasil. O grupo utilizava terras públicas griladas para criar projetos ambientais falsos e lucrar com a comercialização de créditos no mercado internacional de carbono.
Relatórios revelam detalhes da fraude
Dois relatórios finais um de 108 páginas, concluído em dezembro de 2024, e outro de 392 páginas, finalizado em maio de 2025 descrevem como os investigados utilizavam documentos falsos e dados adulterados para registrar propriedades e áreas de preservação que, na verdade, pertenciam à União. O objetivo era inflar o número de hectares “preservados” e gerar créditos de carbono inexistentes.
A PF destacou que o principal investigado, Ricardo Stoppe Júnior, se apresentava como “o maior vendedor de créditos de carbono do mundo” e chegou a participar da COP28, conferência das Nações Unidas sobre mudanças climáticas, realizada em 2023 nos Emirados Árabes Unidos. Segundo os agentes, o grupo planejava ampliar seus projetos para 3 milhões de hectares, uma área superior à de alguns estados brasileiros.
Três núcleos e corrupção de servidores
As investigações identificaram três núcleos de liderança, comandados por Ricardo Stoppe Júnior, Élcio Aparecido Moço e José Luiz Capelasso. O esquema só foi possível, conforme a PF, com o envolvimento de servidores públicos corruptos do Incra, do Ipaam (Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas) e de cartórios da região.
Esses servidores facilitavam a inserção de dados falsos em sistemas oficiais, como o Sigef (Sistema de Gestão Fundiária), permitindo que áreas públicas fossem registradas como propriedades privadas. Assim, o grupo legalizava a posse de terras griladas e simulava projetos ambientais para vender os créditos de carbono no mercado.
Danos ambientais e cifras milionárias
O relatório da PF aponta que, entre as áreas envolvidas no esquema, 537,9 mil hectares foram grilados, avaliados em R$ 819,9 milhões. Houve ainda exploração ilegal de 1,1 milhão de metros cúbicos de madeira em tora e danos ambientais estimados em R$ 606,4 milhões.
Além das fraudes com créditos de carbono, o grupo também atuava em extração ilegal de madeira, desmatamento e criação de “gado fantasma” para inflar os lucros. Em uma das fases da operação, batizada de Expurgare, a PF prendeu servidores do Ipaam e determinou o afastamento do então diretor-presidente do órgão.
Prisões e próximos passos
Na primeira fase da operação, deflagrada em junho de 2024, foram presos preventivamente Ricardo Stoppe Júnior, Élcio Moço, José Capelasso, Ricardo Villares Stoppe e Poliana Capelasso. Ao todo, 76 mandados de busca e apreensão foram cumpridos em Rondônia, Amazonas, Mato Grosso, Paraná, Ceará e São Paulo.
Os relatórios finais da PF já foram enviados ao Ministério Público Federal (MPF), que agora decidirá se oferece denúncia criminal ou arquiva o caso. Os principais investigados respondem por organização criminosa, corrupção, lavagem de dinheiro, falsidade ideológica, estelionato e crimes ambientais.
O que são créditos de carbono
Os créditos de carbono representam uma tonelada de dióxido de carbono (CO₂) que deixa de ser emitida na atmosfera. Empresas e organizações podem comprar esses créditos como forma de compensar suas emissões de gases de efeito estufa. O mercado, no entanto, vem sendo alvo de fraudes e manipulações, principalmente quando os projetos não possuem lastro ambiental real.
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